Da Veja:
Reforma política: o que está em jogo no
Congresso
Relator do tema deve apresentar na
semana que vem seu parecer. Em ao menos nove pontos, deve haver acordo. Mas
falta de consenso põe reforma em risco
Marcela
Mattos
Poucas discussões
são mais antigas em Brasília do que a necessidade de fazer uma reforma
política. Há pelo menos vinte anos o assunto é discutido no Congresso, mas
esbarra sempre na falta de consenso entre parlamentares e no jogo de interesses
partidários movimentados pelo projeto. Pesa contra o tema justamente o fato de
que a reforma tem de ser feita pela própria classe política, cujos interesses
mudam a todo o tempo. Em 2015 a questão voltou à baila no Congresso. A comissão
que analisa o tema foi instalada em fevereiro na Câmara. O calendário proposto
pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), prevê que o relatório final
do colegiado seja votado até meados de maio – e que o plenário vote o tema até
o final do mês. Se os prazos se cumprirem, terá sido um avanço histórico sobre
a questão. Ainda que o consenso não tenha sido alcançado, o relator da
comissão, Marcelo Castro (PMDB-PI), tem definidos alguns dos principais pontos
que serão analisados. E pretende apresentar seu relatório já na semana que vem.
A reforma em
questão prevê a reformulação do sistema eleitoral – e pode alterar desde o
tempo de mandato de parlamentares, prefeitos e presidente da República até o
atual sistema proporcional que define os candidatos eleitos para cargos no
Legislativo. Mas o texto que chegará ao plenário pode provocar mudanças mais
sutis na atual legislação. “A gente tem de dar um passo em cima da democracia.
Eu quero uma evolução e não uma revolução. Não estamos fazendo nenhuma ruptura,
e sim uma evolução”, diz Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente do colegiado.
Uma das maiores
dificuldades de fechar o texto se dá pela grande quantidade de partidos que
hoje existem no país: 32. Todos sobrevivem à custa do Fundo Partidário,
dinheiro público destinado às agremiações. Para este ano, o Congresso aprovou,
com o aval da presidente Dilma Rousseff, a destinação de 867,5 milhões de reais
ao fundo. Além disso, algumas das modificações discutidas podem fazer com que
as legendas de aluguel – usadas apenas para acumular o tempo de propaganda
gratuita – desapareçam.
Há ainda propostas
que podem afetar diretamente os planos dos congressistas, como a que estabelece
em cinco anos o tempo de mandato de todos os cargos eletivos, incluindo o de
senadores, hoje em oito anos. Ou a que unifica as eleições para vereadores e
prefeitos com as do Executivo nacional. “Se não houver um entendimento, um
diálogo que aproxime as várias correntes de pensamento e uma união entre os
líderes para encontrar um sistema que não seja de um partido, não se vota
nada”, afirma o deputado Marcelo Castro.
O peemedebista faz
os últimos ajustes no parecer, que deve ser apresentado nos próximos dias. Em
pelo menos dois pontos, no entanto, será difícil haver acordo: naquele que
estabelece o modelo de financiamento de campanha (público ou privado) e no que
altera o sistema eleitoral, que pode ser majoritário (quando é eleito o
candidato com maioria absoluta dos votos) ou proporcional (quando cada partido
obtém um quociente proporcional ao número de votos recebidos). O relator vai se
reunir com os membros da comissão para tomar uma decisão. Mas avalia que sobre
nove pontos da reforma pode-se chegar a um acordo – o que permitirá colocá-los
no relatório final.
Se aprovado na
Câmara e no Senado até outubro deste ano, o texto da reforma política poderia
ser implementado já nas eleições do ano que vem. Mas a disputa promete ser
ainda mais acirrada do que os projetos comuns. São necessários 60% dos votos
para se aprovar uma emenda à Constituição (necessária para alterar o modelo de
eleição do Congresso). A votação se dá em duas etapas, ambas respeitando o
requisito dos 3/5 para serem avalizadas. A necessidade de alteração no defasado
sistema eleitoral brasileiro é indiscutível – e imperiosa. Resta saber se os
interesses políticos não forçarão o tema, mais uma vez, para o fundo da gaveta.
VEJA OS PRINCIPAIS
PONTOS DA REFORMA
1- Nova
regra para suplência de senador
Como
é hoje - ao apresentar o
registro da campanha, o candidato carrega consigo dois suplentes, que podem
acabar assumindo a vaga sem terem ganhado nenhum voto. Normalmente, são
indicados para o posto parentes dos candidatos ou grandes empresários que
financiam a campanha.
Proposta
- o suplente de
senador obedecerá a ordem da lista dos candidatos mais votados. Por exemplo: no
Distrito Federal, com duas vagas para o Senado, em caso de vacância assumiria o
terceiro mais votado – independentemente do partido e das bandeiras carregadas
pelo substituto.
2- Fim
da reeleição
Como
é hoje: com o mandato de
quatro anos, é permitida uma reeleição para os cargos de prefeito, governador e
presidente da República.
Proposta: acabar
com a reeleição para os cargos de prefeito, governador e presidente da
República.
3- Mandato de
cinco anos para todos os cargos
Como
é hoje: atualmente,
senadores se elegem para oito anos de atuação, enquanto os demais cargos têm a
metade do período.
Proposta: unificar
o período do mandato de todos os cargos eletivos em cinco anos.
4- Unificação
das eleições
Como
é hoje: o Brasil atualmente
passa por campanhas eleitorais a cada dois anos, com as eleições de prefeitos e
vereadores separadas das de presidente da República, governadores, deputados
federais e estaduais e senadores.
Proposta: tornar
coincidente o período das eleições de todos os cargos eletivos.
5- Fim das
coligações proporcionais
Como
é hoje: com 32 partidos
políticos no país, muitas legendas acabam se tornando apenas agremiações de
aluguel, negociando tempo de propaganda em troca de cargos no governo. Sem as coligações,
também fica inviabilizado o chamado ‘efeito Tiririca’, pelo qual, por meio do
quociente eleitoral, os votos de um candidato acabam elegendo políticos de
grupos que se uniram.
Proposta: o
fim das coligações é defendido pelo relator sob o argumento de que tornaria os
partidos mais ideológicos e programáticos. A medida põe fim aos puxadores de
votos.
6- Prazo de
filiação partidária de seis meses
Como
é hoje: para concorrer às
eleições, o candidato deve estar filiado a um partido político pelo menos um
ano antes da disputa. Caso esse período seja inferior, ele estará inviabilizado
de entrar no pleito.
Proposta: reduzir
para seis meses antes do pleito o período mínimo em que um candidato deve estar
filiado à legenda na qual vai disputar as eleições.
7- Mudança na
janela de fidelidade
Como
é hoje: não há na
Constituição a previsão de fidelidade partidária. Conforme resolução do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o partido político pode pedir a decretação
da perda do cargo à Justiça Eleitoral em casos de desfiliação partidária sem
justa causa. Considera-se justa causa a incorporação ou fusão da legenda, a
criação de um novo partido – que deve estar registrado no mínimo um ano antes
do pleito – e desvio do programa partidário.
Proposta: determinar,
na Constituição, que o candidato deve ser fiel ao partido e permitir a mudança
para outra legenda sem a perda do mandato no sétimo mês anterior à data da
eleição. Mantém as regras de justa causa.
8- Redução no
período das campanhas
Como
é hoje: as campanhas têm
duração de três meses e começam após a designação dos candidatos em convenção
partidária, realizadas entre 10 e 30 de junho.
Proposta: reduzir
as campanhas eleitorais em um mês, adiando o período das convenções partidárias
para do dia 15 a 30 de julho do ano da eleição.